Dos resíduos descartados diariamente pela população, como papel e plástico, pesquisadores do Laboratório de Combustíveis e Lubrificantes do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) estão produzindo bio-óleo.
O combustível é utilizado, principalmente, para aquecimento e geração de energia elétrica. A fabricação, em parceria com a empresa Bioware, ocorre através de um processo conhecido como RSU (pirólise de resíduos sólidos urbanos). A técnica consiste na transformação termoquímica de compostos orgânicos, como biomassa e RSU, em outras substâncias através do aquecimento na ausência de oxigênio, e é uma das opções mais cotadas para o tratamento de resíduos, ainda pouco utilizada no Brasil.
Embora a pirólise possa produzir apenas gás combustível como produto final em temperaturas mais elevadas (maiores que 650 ˚C), no projeto utilizou-se no reator descontínuo um aquecimento mais baixo (500 ˚C), com o intuito de se obter como produto principal o bio-óleo.
Produção
O trabalho utilizou resíduos alimentares, papel, papelão e plástico (poliestireno e polipropileno), primeiro isolados e depois misturados entre si para processamento no reator. A equipe do IPT já testou mais de 27 processos diferentes até agora. A ideia foi entender qual a qualidade do bio-óleo obtido a partir de cada composição dos resíduos e suas misturas. Os pesquisadores também conseguiram criar uma equação para estimar o rendimento e o poder calorífico do óleo (potencial energético) a partir das porcentagens dos resíduos na mistura pirolisada, pensando em eficiência de processo.
Análise
Cada amostra de bio-óleo passou por uma caracterização ao final do processo, considerando diversos parâmetros como análise elementar (carbono, hidrogênio, nitrogênio, enxofre e oxigênio), massa específica, viscosidade cinemática, pH, poder calorífico, teor de água e determinação dos compostos orgânicos por cromatografia gasosa. Dessa maneira, é possível estabelecer comparações com os óleos que já existem no mercado.
O uso de polipropileno isolado, por exemplo, que é um derivado de petróleo, originou um óleo com maior potencial energético e uma curva de destilação típica de um combustível automotivo. Na questão do rendimento, porém, apresentou-se menor que o poliestireno isolado.
Já a utilização do poliestireno nas misturas com amostras celulósicas (resíduos alimentares e de papel e papelão), em razão do seu alto teor de carbono, além de aumentar a qualidade do bio-óleo, ampliou o rendimento da fração líquida da pirólise. No entanto, a presença da celulose produz um bio-óleo com alto teor de água e ácidos. Nesses casos, estudos de separação e melhoramento dos óleos deverão ser realizados, caso se considere a possibilidade de utilizá-lo no mercado.
Reaproveitamento
O projeto, desenvolvido em escala laboratorial, apresenta alternativas de geração de energia e matéria-prima a partir de resíduos sólidos, atualmente mal aproveitados no País. Segundo dados divulgados pelo Panorama Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), de 2017, estima-se que 41% dos resíduos coletados regularmente ainda tenham destinação inadequada, enquanto 59% (cerca de 42,3 milhões de toneladas) são dispostos em aterros sanitários, sem nenhum reaproveitamento.
Estudos mais aprofundados e em escala piloto, e considerando a viabilidade técnica, econômica e ambiental, devem ser realizados a partir de agora, diante das possibilidades de destinação dos resíduos sólidos urbanos.